Translate

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Comunicar com o Doente Crítico

Desde o início do meu ensino clínico, a minha maior dificuldade tem sido comunicar com os doentes críticos, quer por nem sempre compreender bem o idioma espanhol, quer por dificuldade de comunicação do doente crítico que, ou está sedado ou tem uma traqueostomia ou, finalmente, tem um tubo endotraqueal.

No início da semana passada, particularmente, senti-me bastante impotente porque não conseguia entender uma das doentes que tinha uma traqueostomia, através da qual respirava, pelo que lhe era impossível comunicar oralmente.

Consequentemente, senti que não estava a prestar os cuidados adequados àquela pessoa. Apesar de conseguir ver na cara dela que ela estava com dor ou com desconforto, não conseguia entender qual era o nível de dor/desconforto que sentia nem o que podia fazer para a aliviar dessa situação.

Dois autores distintos enunciaram duas ideias, que apesar de distintas se complementam perfeitamente uma à outra e que vão de encontro a situações como a que acabei de referir.

"O cuidar é feito com o outro e não apenas um procedimento, uma intervenção técnica mas uma relação de ajuda, que envolve respeito, compreensão e o uso do toque de uma forma mais efectiva" (WALDOW, 1998 citado por INABA et al, 2005).

Assim sendo, é fundamental que a comunicação seja adequada, principalmente no cuidado ao doente crítico. Então, comunicação adequada é "aquela apropriada a uma determinada situação, pessoa, tempo e que atinge um objectivo definido" (SILVA, 1996 citado por INABA et al, 2005).

Tem em conta estes princípios básicos, perante aquele momento de impotência, tentei não desistir e encontrar outras estratégias para conseguir comunicar adequadamente com a doente em questão.

A primeira coisa que fiz foi referir à doente, de uma forma simplificada, que não era de origem espanhola (e sim portuguesa), pelo que não dominava muito bem o idioma. 

De início pensei que esta informação não fosse ser muito útil contudo, veio a revelar-se como o mais importante que podia ter dito, porque a partir daí, ela tomou consciência da minha dificuldade e tentou adaptar as suas dificuldades de comunicação às minhas, de tal forma que nos conseguíssemos entender uma à outra.

Então, através de gestos corporais e da leitura dos lábios, que foi possível porque a doente soletrava lentamente as palavras, consegui entender que ela estava desconfortável e com dores na região torácica por ter secreções acumuladas na árvore traqueobrônquica que não conseguia eliminar e, portanto, queria que de alguma forma a ajudássemos a eliminar essas secreções para ficar mais confortável.

Assim sendo e após ter explicado a situação à enfermeira que estava com esta doente, perguntei à doente se esta queria que lhe aspirássemos as secreções, à qual reagiu afirmativamente. Depois de efectuado o procedimento, foi notável a satisfação e o conforto da doente, que me agradeceu por a ter compreendido correctamente.

Também eu fiquei muito satisfeita, não só pela doente mas também por mim, por não ter desistido e ter conseguido ultrapassar, em certa medida, a minha dificuldade com a comunicação, uma vez que durante o resto da semana já foi muito mais fácil comunicar, não só com esta doente mas com outros também.

Penso que esta dificuldade foi como que um ponto de viragem na minha dificuldade em comunicar, quer com o doente quer com o restante pessoal da equipa multidisciplinar do serviço, uma vez que a partir daqui fiquei mais confiante nas minhas capacidades de aprendizagem e mais desinibida para expor as minhas dúvidas.


"Conceito outrora pouco valorizado, a comunicação na relação enfermeiro/doente assume hoje um valor fundamental e torna-se objectivo estratégico na gestão dos problemas de enfermagem. A comunicação é cada vez mais uma componente a valorizar, não só pela sua importância na relação que se estabelece entre estes intervenientes no processo de cuidar, como pelo facto de constituir um bom indicador da qualidade dos cuidados" (BRIGA, 2010).

Tendo em conta tudo o que foi sendo dito ao longo desta reflexão, posso dizer que a comunicação é um factor fundamental na prestação de cuidados de enfermagem, pelo que esta deve ser sempre adequada ao doente que temos à nossa frente e com vista a promover o seu conforto e bem-estar, na medida do possível.

Comunicar é um processo complexo e multifacetado e em enfermagem requer uma reciprocidade de compreensão entre aquele que cuida e aquele que recebe os cuidados, para que estes possam ser adequados e eficazes, tanto na promoção do conforto do doente como na melhoria da prestação de cuidados de qualidade pelo enfermeiro.

Em suma, como estudante de enfermagem, devo ter uma especial atenção ao comunicar com os doentes, especialmente doentes em estado crítico, que na maioria das vezes estão incapacitados de comunicar e que pelo seu estado de saúde, necessitam de cuidados muito específicos e por vezes, complexos, daí a importância de ser capaz de os entender.

Espero que daqui para a frente continue a ser capaz de ultrapassar as minhas dificuldades, em todos os níveis mas especialmente em termos de comunicação, dada a sua grande importância na prestação dos cuidados de enfermagem.


BIBLIOGRAFIA:

BRIGA, Sónia Cristina Pinto. A Comunicação Terapêutica Enfermeiro/Doente: Perspectivas de Doentes Oncológicos Entubados Endotraquealmente. [Em Linha). Porto, 2010. [Consult. a 17 de Outubro de 2012]. Disponível em WWW: URL<http://molar.crb.ucp.pt/cursos/1%C2%BA%20e%202%C2%BA%20Ciclos%20-%20Lics%20e%20Lics%20com%20Mests/MD/2%C2%BAANO/1%C2%BASEM/21-UCL1/TRS/Dissertao%20Mestrado%20S%C3%B3nia%20Briga%20(leitura%20opcional%204%C2%AA%20aula%20-%20pp.%2027%20-%2031).pdf>.

INABA, Lucinda Cintra; SILVA, Maria Júlia Paes; TELLES, Sandra Cristina Ribeiro. Paciente Crítico e Comunicação: Visão dos Familiares sobre a sua Adequação pela Equipa de Enfermagem. [Em Linha]. 2005. [Consult. a 17 de Outubro de 2012]. Disponível em WWW: URL< http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0080-62342005000400008>.

Sem comentários:

Enviar um comentário